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segunda-feira, 7 de fevereiro de 2011

As esferas econômicas globais

Jean-Pierre Lehmann
Valor Econômico

Enquanto o mundo passa pelo fim da primeira década do século XXI, e entra na segunda, podemos tirar uma conclusão. Vivemos em uma época onde as mudanças são rápidas e profundas. Charles Darwin comentou que "não é o mais forte da espécie que sobrevive, nem o mais inteligente, porém o que melhor se adapta às mudanças". Como vivemos em tempos incertos, é arriscado fazer qualquer tipo de previsão.

No entanto, o que me proponho a fazer aqui é pintar um possível retrato da paisagem da economia mundial no final da próxima década: em 2020. É muito improvável que daqui a dez anos a realidade vá corresponder à minha narrativa. Esta narrativa é, em parte, para imaginar uma possível visão do mundo, mas seu maior propósito é ressaltar que é certo que haverá grandes rupturas. O ano de 2020 será diferente de 2010, assim como 2010 foi diferente de 2000.

No século passado, a economia mundial era dominada pelos EUA e, em menor escala, por alguns países da Europa Ocidental e Japão. Essa narrativa prevê sete grandes esferas globais. Essas esferas não são autárquicas e incluem elevado grau de interdependência - pressupondo que o sistema multilateral global fundamentado em regras seja mantido. Outra narrativa, decorrente do protecionismo ressurgente, seria imaginar um conflito econômico agudo entre as esferas.

Começando pelo Oriente, temos a Esfera Econômica da Grande China, enorme e em expansão, que abrange a Ásia-Pacífico. Dentro dessa esfera há subesferas, que incluem Coreia, Japão, Austrália e ANSA. Nenhuma, contudo, constitui uma esfera própria e todos olham para a China como a locomotiva da economia regional. A Esfera Econômica da Grande China tem ligações extensivas e intensivas com as outras esferas e com países fora de esferas específicas, como na África.

No século passado, a economia mundial era dominada pelos EUA e, em menor escala, por alguns países da Europa Ocidental e Japão. Agora há sete grandes esferas globais, que não são autárquicas e incluem um elevado grau de interdependência

A Esfera Econômica da Índia é substancial devido à sua demografia e crescimento econômico. Entre as muitas dificuldades de expansão, vemos o fato de que a Índia, ao contrário da China, se engaja muito pouco em comércio e investimento com seus vizinhos, principalmente os dois grandes, Paquistão e Bangladesh. É improvável que "uma esfera econômica indiana maior", que engloba o sul da Ásia, venha a surgir em 2020.

Ao norte está a Esfera Econômica da Rússia, englobando as economias da antiga União Soviética. Ela está diminuindo em tamanho e influência, principalmente devido à demografia. A população da Rússia vai diminuir dos atuais 140 milhões a 90 milhões até 2050. A Rússia continua a ser essencialmente uma economia de petróleo e gás. Ao contrário das outras economias Bric, o país não fez profundas reformas voltadas para o mercado.

No sudoeste há o surgimento de uma Esfera Econômica Neo-Otomana. A Turquia é um dos países que passaram por uma das transformações mais notáveis desta última década. Começou a década muito mal, com uma grande crise econômica, mas a economia turca emergiu revitalizada e reformada, sendo a que mais cresce da OCDE. A Turquia também tem passado por uma importante mudança de suas aspirações para se juntar à União Europeia (UE) e desenvolver uma política muito mais independente, renovando os laços com seus vizinhos orientais Síria, Iraque e Irã, e também com o Oriente Médio e África.

A Esfera Econômica da União Europeia ainda está lá, embora seu peso relativo e absoluto na economia mundial vá entrar em declínio. De novo, devido em boa parte à sua demografia, mas também por não "se adaptar às mudanças", citando Darwin novamente. Ela não reagiu bem à mudança e virou-se para dentro. Há muitas incertezas sobre seu futuro, incluindo sobre o euro.

No outro lado do Atlântico, eu vejo duas esferas bastante robustas, ao norte e ao sul. Há a Esfera Econômica da América do Norte, composta por Canadá, EUA e México. Ao superar as atuais dificuldades, há bons motivos para prever que os EUA continuarão a ser uma importante força global. Isto é em parte devido às forças positivas que ainda impulsionam a economia norte-americana - principalmente a da inovação, mas também a da imigração, sendo ambas fortemente interligadas. Além disso, a esfera norte-americana abrange uma economia emergente dinâmica, o México, algo que a UE não tem contanto que mantenham a Turquia afastada.

Na América do Sul há a Esfera Econômica do Brasil. Se as "premiações Darwin" fossem dadas aos países que melhor reagiram às crises, o Brasil seria o vencedor disparado, tendo, possivelmente, a Turquia em segundo lugar. O Brasil é uma grande economia mundial, competitivo em muitas áreas e com fortes corporações multinacionais. Porém, o mais importante, sob as sucessivas administrações dos presidentes Fernando Henrique Cardoso e Luiz Inácio Lula da Silva, o Brasil obteve sucesso não apenas em suas políticas econômicas, mas também em termos sociais. Houve uma redução significativa da pobreza e, ao contrário da maioria dos países no mundo, redução da desigualdade.

Não há, no momento, o surgimento de uma Esfera Econômica da África. Resta ver qual será a evolução nesse continente durante esta próxima década.

Jean-Pierre Lehmann é professor emérito de International Political Economy no IMD, e diretor fundador do Evian Group no IMD. Ele é co-editor de Peace and Prosperity Through World Trade, Cambridge University Press.
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